quinta-feira, 14 de maio de 2009

Ewerest


A noite fresca era um convite à caminhada. Parou defronte seu amontoado de calçados e lá de baixo de quase tudo viu umas sandálias de couro que há muito, não usava. Mentalizou-as em conjunto com a roupa que já estava e pensou: é você!
Saiu todo garboso, andando com as bonitas. Fez questão de passar do lado de um grupinho de garotas com a sensação de que iria chamar a atenção, se chamou, já não sei, mas ele estava se sentindo o “must”.
Caminhou por mais um tempo. Percebeu então, que as sandálias por vezes queriam sair voando de seus pés, pois não tinham aquelas correias atrás do calcanhar. Alguns metros adiante, seus pés já estavam ficando doloridos e estava mais cansado que o normal, pois estava com dificuldades para manter as danadas presas aos pés e não vê-las ficando pra trás ou sumindo lá adiante. Sem falar no solado duro!
Tinha caminhado um tanto bom e agora só pensava na volta. Já não tão orgulhoso das sandálias e desejando com toda força estar com um de seus tênis, nem que fosse o Reebok mó velhão. Tirou as malditas dos pés, porque já estava andando todo torto. Sem falar que estava prevendo as bolhas que iam aparecer.
Enfiou uma mão em cada uma delas e partiu pra casa. Pelo caminho reparou o quanto as texturas de cada pedaço de asfalto e de cada calçada eram diferentes entre si. Umas tão lisinhas e outras superfícies tão grotescas e com saliências que faziam doer suas solas fininhas, tão acostumadas ao aperto sufocante dos calçados.
Quis de todo coração que algum conhecido passasse e lhe desse uma carona pra casa. Já não sabia o que era pior, descalço ou com as filhas da puta. Nessas horas não se pensa mais direito. A meta era só uma: chegar em casa.
Continuou caminhando fazendo caretas de dor, tantas que já estava repetindo algumas. Eram tantas as pedrinhas minúsculas, buracos, lixo ou qualquer outra coisa que o tato menos evoluido das solas não identificavam.
Pulava daqui, desviava dali e mentalizava qual rua seria melhor pegar, por conta do tipo de calçada que iria ter que passar.
Já estava exausto. Ficou lembrando de quando era criança e corria pelas ruas descalço. Como não doía? As ruas não tinham pedras? Os pés da gente são mais resistentes quando se é mais jovem? Seria o peso? É, não tinha mais 20 quilos e se lembrou de como havia engordando depois do casamento. "Por que isso acontece depois que a gente casa?" Pensou sobre o assunto um instante. Teria tentado solucionar esse outro mistério se a atual situação não o estivesse flagelando tanto.
Acabou fazendo um caminho mais longo devido ao tipo de lugar que preferiu passar.
Chegou em casa com um sentimento de glória e fadiga de quem chega ao pico do Ewerest.
Rita o assistiu chegar com cara de poucos amigos e sem a olhar nos olhos, isso fez com que permanecesse calada. Entendeu tudo quando viu as sandálias nas mãos. As mesmas que na ocasião da compra, o elertara do quanto seriam desconfortáveis.
Osmar foi direto tomar uma ducha e tirar a nhaca que trazia nos pés. Enquanto a água caia, pensava no quanto um sapato chega sujo da rua.
Rita foi-se rindo pra cozinha pegar um copo de Coca. Calçava suas Hawaianas amarelas com as correias enfeitadas com canutilhos e miçangas. Enquanto andava, as olhava e pensava como eram lindas e confortáveis. Voltou pro quarto e terminou de assistir Caminho das Índias.

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