quarta-feira, 15 de abril de 2009

Catavento



Antes havia um cheiro...Tão presente que poderia ser tocado, que pairava leve num tom de um azul que é dos sonhos. Mas o que seria o cheiro comparado ao toque? Seda lisa e refrescante que se derramava.
Graciosamente
eram um.
Poderia sentir uma agradável e serena lembrança, se o catavento furtacor que espelhava a boca cor de maçã mordida a dois, sob luzes coloridas e cintilantes, agora não fosse cor de um gris desejo.
O catavento onde acalantadamente giravam, rodopia diferente. De tão ligeiro condensou as cores e agora é cor de uma névoa tão espessa que a luz já não transpõe.

Sensibilidades, peles, braços, olhos, mãos. Rubros amores, rosa.
Desejos, suores, céus da boca, línguas, ventres. Negros rancores, cinza.

Uma rolha que rolou sob o móvel há alguns dias e a fumaça dançarina que sobe do único ponto de luz visível, são derradeiras testemunhas de um peito que poderia amar, mas lá já não há mais nada capaz de tal proeza, há somente uma esponja ressequida e pálida que não pulsa a vida de outrora, mas que espera a doce, úmida, quente, gloriosa e escarlate vingança.

Um comentário:

  1. O que não é a ficção senão a re-elaboração da não-ficção tornada outra numa nova dimensão?! Belíssimo escrito ! Parabéns! Que as musas continuem a te embalar em suas graças. Um abraço Val.
    Ademir

    ResponderExcluir